quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Protestos estéticos e a morte da mídia.


Manifestantes ocupam Wall Street. É certo que a manifestação é pacífica, com um quê de descomprometimento, quase uma festa ou acampamento de um festival de rock. Não tem nada a ver com a chamada “Primavera árabe”, nem com os distúrbios recentes na periferia de Londres. Mas de qualquer maneira, chama a atenção. Não é todo o dia que o povo americano sai às ruas para protestar contra o próprio país, ou, neste caso, contra o modelo econômico da América.
Se há manifestantes por lá, é porque a crise americana é mais profunda do que aparenta ser no noticiário do mundo inteiro. Os índices de desemprego cada vez maiores e o poder de compra cada vez menor certamente são mais agudos do que as taxas que são apresentadas. Os manifestantes americanos, evidentemente, tem uma motivação muito pessoal para ocupar um dos símbolos da pujança econômica dos Estados Unidos: o bolso vazio, e é só isso. O argumento de que “o mundo está mudando” ou que uma revolução promissora está em processo não deixa de ser apenas uma sedutora ilusão.
Ainda assim, é uma evolução. Com geladeiras e estômago vazios, há se fazer um “panelaço” e reivindicar a sobrevivência nossa de cada dia. Mesmo que inconscientemente. Sinal que, ainda assimilada por personalistas e egocêntricos (a salvo às exceções), nem mesmo a mais harmoniosa sociedade ou estado ideal, no caso a americana, perfila impunemente seus fantasmas e esqueletos sem serem vistos. Há de se manifestar, de se organizar, de se mobilizar o tempo todo, mesmo que nas platitudes do imaginário coletivo apenas pulse suavemente o desconforto do controle social – regido pelo fenômeno midiático, pelas políticas de Estado, pela repressão da violência policial (a silenciosa, que inibe). O homem do Século XXI não está no seu lugar, ele sabe disso – mesmo que inconscientemente.
O Facebook e Steve Jobs também não mudaram o mundo. Martin Luther King levou tantas mil pessoas a Washington sem redes sociais, nem mesmo iPhones. Nas “Diretas Já”, por aqui, milhares foram a Praça da Sé sem necessário “tuitar”. E o que dizer então dos milhares que pulavam na avenida Bernardo O’Higgins, no Chile, contra as “múmias” do desgoverno velho que seria substituído pelo governo novo? Não precisaram do Orkut, nem de malas diretas por spam’s ou da vedete daqueles tempos – o telefax. Um famoso líder sindical falava a um estádio inteiro sem precisar de microfone – sua voz era reproduzida de um epicentro até a perifeira por um coro de vozes que caminhava por ondas. Expandiu os limites do estádio. O discurso, quando existir, mesmo que por sinal de fumaça, será ecoado, reverberado.
A serpente sinuosa e de sedução devastadora da deusa midiática ficará velha, flácida, decrépita. Quando chegar esse tempo, quando se pressentir a morte da mídia, quando o imaginário coletivo for tão esclarecido como um salão iluminado, aí sim, seja em Wall Street ou em qualquer lugar do mundo ocidental, se empreenderá algum tipo de “revolução”. Será um tempo em que o consumo desvairado será substituído pela necessidade de entendimento e do viver de maneira harmoniosa com o semelhante – profecia improvável, utópica.